quarta-feira, 5 de março de 2008

Discurso, cotas, cores e desigualdade racial


De todos os discursos, os que falam de “desigualdades”, o que percebo mais justo em nosso país, (não em uma relação hierárquica aonde existe prioridades no ramo da desigualdade) no sentido de tomada de espaço e consciência é o discurso da desigualdade racial.

Alguns brasileiros não conseguem fazer a leitura histórica de mais de trezentos anos de escravidão em território nacional, esquecem até mesmo dos dias atuais e das condições precárias que a maioria da população negra se encontra meio ao preconceito e demais formas de opressão gerados pelo capitalismo como a fome e a falta de condições sociais.

O discurso que não existe preconceito racial é tão bem arquitetado entre os brancos dominantes e alguns negros de cabeça branca como diria Malcolm X, que em algum momento chego a acreditar que venho a cometer injustiças por colocar o negro em uma situação desprivilegiada no quesito social.

O discurso hipócrita como exemplo que as cotas universitárias para negros em universidades públicas é uma forma de preconceito, de “novo apartheid”, me faz lançar a todos aqueles que se vestem destes dizeres algumas perguntas: Quem está com a maioria dos bancos docentes, brancos ou negros? Quem é chamado de mulato (na escravidão mulato era o filho de uma negra “mula” com um homem branco “anta”, dando um ser nem negro e nem branco, bastardo e rejeitado pela família paterna), este que se acha branco para fugir das piadinhas racistas, que se cria uma casta clara virtual para se defender das agressões dos “indivíduos mais claros”. Quantos estudantes negros existem nas universidades públicas? É questão de mérito ou de problemas históricos a falta do negro nos espaços de poder?

Aproveitando as perguntas, venho com outros questionamentos do porque da preferência entre meninos brancos nas adoções? Porque de dizer “este negro é lindo”, será que existe negro feio e negro lindo enquanto o branco não tem esta subdivisão? Porque o negro é subdivido em mulato, escurinho, clarinho, moreninho, isso para não falar da chacina em Ruanda gerada pela subdivisão dos negros fomentada pelos próprios europeus brancos. Este tipo de política existe até hoje no mundo para vender armas, vejamos os últimos vinte anos quando falamos de Serra Leoa, Congo e o pacifico americanizado Quênia. Sem falar na atitude americana de criar a Libéria!

Mesmo não generalizando, o gosto das “loiras” namoradas dos jogadores de futebol, dos artistas musicais, das personalidades negras, mas se você é um negro pobre e tenta puxar conversa com estas mesmas “loiras” na rua pode ocorrer o equivoco de ser confundido com um tarado ou até mesmo com um ladrão.

Para alguns é muita coincidência de que a maioria das periferias do Brasil morem negros, como antes dito, não é importante para os brancos fazer uma análise fria sobre escravidão e pós-escravidão no Brasil, tudo é um mero contexto social, agora se o branco sair de terno da favela e dirigir um carro importado a meia noite e ser parado por uma blitz policial, este será chamado de doutor. Já o negro com o mesmo terno e o mesmo carro importado, parado na mesma blitz pode ser inicialmente o motorista ou até mesmo em condições mais extremas como o ladrão do carro qual este dirigia antes da blitz.

Martin Luther King, um grande mobilizador e pioneiro nos Estados Unidos na luta pelos direitos civis, relata em seus escritos de que quando pequeno não entendia o porque de sentar em um lugar diferente no ônibus em Atlanta e nós aqui no Brasil ainda também não entendemos o porque da dificuldade de se conseguir emprego como recepcionista quando se é negro.

A dinâmica da desigualdade racial é interligada com a hipocrisia de um povo que um dia justificou na cor da pele a falta de capacidade de pensar e daí veio à escravidão tanto no Brasil quanto em grande parte do mundo, afinal já que estes não tinham capacidade de pensar como os brancos, poderiam ser vistos como animais, vendidos no pelourinho ou por quanto vale ou por quilo.

A tomada de consciência, conceito marxista, deve ser um objetivo claro dentro dos movimentos que trabalham com a identidade negra. Afirmar a negritude como no Movimento Panteras Negras nos anos setenta e oitenta era uma grande oportunidade de aumentar a estima e politizar este que sofre cotidianamente pela descriminação racial.

Termino lembrando uma frase da música Voz Ativa dos Racionais MC’s que falava “O carnaval era a festa do povo, era... mas alguns negros se venderam de novo. Brancos em cima, negros em baixo. Ainda é normal, natural 400 anos depois, 1992 tudo igual. Bem-vindos ao Brasil colonial”.


Leonardo Koury Martins

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